Entrevista com o advogado Rodrigo Salgado

Postado por Jorge Ribeiro | 13:09 | | 1 comentários »

5 de novembro de 2010

Por Jorge Ribeiro

Na tarde do dia 14 de maio de 2008, o advogado Rodrigo Salgado Martins foi algemado e conduzido à carceragem do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ). Após 40 minutos de revista, a embalagem metalizada do drops que ele trazia num dos bolsos de seu paletó foi identificada como a causa de seu impedimento pelo detector de metais. Mesmo após isto, os seguranças não o deixaram passar e exigiram o seu retorno à fila. O advogado então resolveu esperar a chegada do juiz corregedor para solucionar o impasse. Ao sentar-se em uma cadeira que estava vazia, o advogado foi preso por desacato. A cadeira era do supervisor de segurança do local.

Após cerca de três anos, saberemos do advogado quais foram as consequências e o resultado desse lamentável acontecimento na entrada do Palácio da Justiça do Rio de Janeiro.

Revista Juris: Antes da entrevista, o senhor revelou que sente vontade de chorar ao comentar aquele episódio. O que sente afinal? Tristeza, constrangimento, revolta, impotência...?

Rodrigo Salgado: Acho que um misto. Sinto tristeza, pois a classe está desamparada, um Advogado tentando exercer o seu oficio é desrespeitado a todo o momento. Desde a porta do fórum até o juiz que não lhe atende; Constrangimento, pelo fato em si da agressão e desrespeito com que fui tratado. E impotência em face da impunidade, não só por não haver uma posição firme de retaliação pela administração do TJ-RJ, como também pelo fato dos mesmos não terem sido condenados pelo abuso de autoridade e lesão corporal. De fato foi detectada pela própria justiça a prisão ilegal, entretanto os culpados não foram punidos e continuam trabalhando no fórum. Em âmbito cível o processo ainda tramita na 14ª Vara de Fazenda Publica em vias de prolação da sentença. Mentiram muito na Audiência de Instrução e Julgamento, espero que o Juízo chegue à conclusão do que verdadeiramente ocorreu, da Gravidade do que ocorreu e da extensão dos danos. Tais fatos são verdadeiramente revoltantes.

Revista Juris: Durante minha experiência como repórter de setor no Palácio da Justiça do Rio de Janeiro, eu comparava o Fórum como verdadeiro santuário dos advogados, onde a categoria exercia o sagrado direito de defender suas causas. Hoje posso continuar a comparar o FÓRUM como santuário ou já não é mais assim?

Rodrigo Salgado: Nós sempre temos bons juízes, independentes, bons servidores. Mas a Justiça, como macro sistema está enferrujada e está tomada por questões de influências externas, estranhas à legalidade e que não são combatidas. Este sistema presta-se a desincentivar a advocacia com sua morosidade e desrespeito ao profissional Advogado, em seus direitos e prerrogativas. Como professor da UFRJ diagnostiquei que 95 por cento dos alunos não querem advogar. A visão, antes de se formar que o estagiário tem já lhe trás a ideia de que, não é aquele estresse que ele deseja para sua vida. O Advogado como profissional liberal está ficando assolado. Com atos processuais morosos, dificuldades mil no dia a dia da profissão, e com a demora para levantamento de mandados de pagamento, a advocacia como negócio acaba por se tornar inviável. Deixou, Jorge, de ser aquele santuário que você cita, para dar vez a um jogo de influências onde os mais poderosos dão as cartas.

Revista Juris: Durante sua prisão no Fórum, como a OAB-RJ se comportou? O senhor teve o apoio necessário?

Rodrigo Salgado: O apoio da OAB/RJ se restringiu ao dia do fato. Tive que me amparar com conselheiros da oposição, que já estavam descontentes com a falta de independência e a má gestão que a mesma apresentava. Depois que aceitei ajuda dos conselheiros da OAB, o presidente determinou que não acompanhassem meu caso. Assim como, uma semana antes o Advogado Saulo Nunes também havia sido preso e a OAB/RJ sequer realizou qualquer procedimento administrativo, interno ou junto à administração do TJ-RJ. É um órgão hoje que não defende efetivamente o Advogado em suas prerrogativas e “o seu ganha pão” efetivamente. Tomada por influências políticas e interesses transversos, perdeu totalmente sua representatividade e autonomia.

Revista Juris: E o TJ-RJ? Qual foi a atitude da administração do Fórum?

Rodrigo Salgado: A administração do TJ foi complacente e sequer instaurou procedimento para averiguar falta disciplinar, cometimento de abuso de autoridade ou congênere, tudo porque a verdade é que havia ordem superior para aquele tipo de tratamento. Como disse, estou certo que isto faz parte de um intuito de desincentivar o profissional Advogado, acreditam que desestimulando o profissional, a demanda da justiça irá diminuir. O que é um absurdo, posto que se não houver processos a justiça não tem receita para funcionar.

Revista Juris: O que a OAB, em sua opinião, tem realizado de concreto para acabar com as humilhações que a categoria vem sofrendo, haja vista reclamações de seus colegas terem também sofrido constrangimento na entrada do Fórum, ou em cartórios?

Rodrigo Salgado: A OAB/RJ não atua neste problema, trabalha apenas com aparências, publicando na Tribuna do Advogado que existe o problema das filas do PROGER, sem sequer ter uma atitude firme e independente. São milhares os problemas que assolam o Advogado em seu cotidiano e a gestão da OAB/RJ é fraca e não possibilita uma melhoria por falta de interesse político, o que não deveria haver numa entidade representativa de classe.

Revista Juris: Ao tentar se colocar no lugar de um estagiário de direito, cheio de expectativa para iniciar os trabalhos na advocacia, entra no Fórum e se depara com um futuro colega algemado, sendo conduzido para o xadrez. Tudo em função de um “drops” e por ter sentado na cadeira de um segurança. O que o senhor teria a dizer para este estagiário? 

Rodrigo Salgado: Que não desanime que lute como faço, para que possamos mudar o nosso futuro, tendo como ideal que tudo pode ser mudado, só depende de nós. Advocacia é efetivamente o pilar do Estado Democrático de Direito. O que aconteceu comigo, nem na ditadura ocorreu, onde os Advogados eram muito respeitados, mas temos que ter a força da mudança e transpassar para o colega desmotivado, para o estudante que fica sem rumo, para o usuário da Justiça que vê uma cena deplorável como esta, que nem tudo está perdido, ainda existe um caminho e a nossa força interna com a crença divina e que nos faz batalhar e continuar lutando por dias melhores... E dificuldades encontraremos a todo momento na vida o que importa é agirmos perseguindo aquilo que é correto e honesto enfrentando as adversidades.

Revista Juris: Dr. Rodrigo Salgado teve uma concessão em ordem de Habeas Corpus para trancamento do procedimento criminal contra o Sr. e, posteriormente, houve Representação pelo crime de abuso de autoridade contra os policiais e seguranças. Em que pé está esta representação? O promotor denunciou aqueles que lhe prenderam e lhe agrediram?

Rodrigo Salgado: Não, infelizmente estamos enfrentando um corporativismo forte, posto que aqueles policiais são responsáveis pela administração da segurança do Tribunal. O Promotor não denunciou, opinou pelo arquivamento e o Juízo seguiu o mesmo caminho. Deveras, as ordens partiram da Administração da segurança. O delito de abuso de autoridade efetivamente ocorreu, mas esperaram prescrever, deu-se a prescrição. É uma vergonha. E nossa entidade de classe não estava ali para manifestar repúdio à decisão e nem pressionaram para que os mesmos respondessem por seus atos. A prisão ilegal e agressão foram ali representadas por toda classe e a OAB/RJ preferiu agir politicamente, ao invés de dar resposta à altura dos acontecimentos...

Revista Juris: Para concluir, eu pergunto: Diante do ocorrido, qual a experiência que o senhor obteve de toda essa história. Qual o seu sentimento diante de tudo isso?

Rodrigo Salgado: Lembro que o fato nos leva a alguns eventos ocorridos na época da ditadura com indivíduos-cidadãos que na época lutavam por seus direitos fundamentais e eram agredidos pelo Estado, estes que hoje possuem famílias com altas pensões e que receberam indenizações Milhonárias, por força de lei. Sinto sim, desgosto por não ver uma Promotoria ativa no que diz respeito aos Direitos Humanos, por não ver a JUSTIÇA fazendo seu papel, por não ter sido amparado pela minha entidade de classe OAB/RJ, embora a mesma tenha enviado via e-mail: Carta aos Advogados, com a expressão “inimaginável prisão do Advogado Rodrigo Salgado”. E por ter certeza da IMPUNIDADE, de perto.

1 comentários

  1. Anônimo // 25 de novembro de 2010 às 08:14  

    Matéria interessante!